Erros do Estado

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Erros Cometidos no Processo e na Perícia

Esta seção detalha os erros graves e inconsistências que ocorreram ao longo da investigação, da perícia e do processo judicial. Esses erros contribuíram para uma condenação injusta, ignorando provas cruciais que poderiam ter mudado o rumo do julgamento. Aqui, apresento os pontos principais que demonstram como o Estado falhou na busca pela verdade.

É importante compreender a linha do tempo de alguns acontecimentos, porque a ordem cronológica e espaçamento entre as informações disponibilizadas contribuiram para um total cerceamento de defesa. Veja:

18 de julho de 2016

Próximo às 04:00

Priscylla comete suicídio.

Início da manhã

Polícia Civil comparece a nossa residência. Estou em casa enquanto o delegado e alguns peritos trabalham. Essa perícia inicial dá origem ao laudo de perícia de local de crime. Ao sair, o delegado leva nossos documentos, meus e de Priscylla, e libera a casa para uso.

Próximo às 10:00

Me dirijo até a Central de Polícia, local que concentra diversas delegacias da cidade, para retirar nossos documentos. Novamente estou na presença das autoridades policiais.

Próximo às 11:00

Vou até o IPC onde se encontra o IML da cidade. Apresento nossos documentos para que a funerária possa começar o preparo de Priscylla. Quando chego lá, o exame tanatoscópico já havia sido concluído e ela está liberada. A descrição dos ferimentos de entrada e saída do exame tanatoscópico diferem da descrição feita pelos peritos de local de crime.

Restante do dia

Durante o restante do dia vou até a funerária, até a casa dos pais dela, me dirijo ao velório e fico por lá até pouco depois das 23h.

19 de julho de 2016

Próximo às 08:00

Retorno ao velório.

Próximo às 11:00

Priscylla é sepultada e na saída do cemitério sou abordado por agentes da delegacia de homicídios.

Próximo às 14:00

Durante meu depoimento, sou informado que as perícias (local de crime e tanatoscópica) descartaram o suicídio por ausência de elementos secundários do tiro no corpo de Priscylla e recebo voz de prisão. O advogado que me acompanha solicita exame residuográfico em minhas mãos.

Próximo às 15:00

Durante exame de corpo de delito, o IPC emite um documento justificando a recusa para que o exame residuográfico seja realizado em minhas mãos naquele momento.

20 de julho de 2016

Próximo ao meio dia

Delegacia prepara coletiva para imprensa e eu sou apresentado como assassino em toda mídia paraibana. Durante a apresentação, a delegada já conclui que Priscylla tinha chumbo na mão esquerda por uma tentativa de defesa e diz que o atirador era mais alto do que ela, justificando a trajetória descendente do tiro em sua cabeça. A polícia diz que eu teria simulado uma cena de suicídio.

Próximo às 15:00

Uma equipe de peritos da polícia paraibana volta até nossa residência e inicia uma perícia complementar. Foi apenas neste momento que estojo, projétil e toalha foram recuperados e levados para análise, demonstrando a total fragilidade do trabalho realizado pela perícia de local de crime. A equipe de peritos já não tem acesso ao corpo de Priscylla e ficam apenas com as impressões relatadas por seus dois colegas que estiveram inicialmente em nossa casa. Antes mesmo de iniciarem o seu trabalho, eu já estava preso e a policia paraibana já tinha apresentado suas conclusões para a imprensa. A perícia complementar teria sido induzida a chegar à conclusão já determinada?

08 de agosto de 2016

Denúncia do Ministério Público

MP prepara denúncia e afirma que eu efetuei DOIS disparos em Priscylla. Naquele momento, apenas os laudos de perícia de local de crime e tanatoscópico estão no processo. Nenhuma perícia e nada no inquérito cita um segundo tiro.

02 de dezembro de 2016

Resposta à acusação

Minha defesa peticiona a resposta à acusação, anexando um laudo premiliar de mais de 100 páginas elaborado pelo Dr. Levi Inimá de Miranda. Naquele momento, Dr. Levi tinha acesso apenas aos laudos de local de crime e tanatoscópico. Não tínhamos as imagens desses laudos além das que estavam impressas no processo físico.

29 de setembro de 2017

Pronúncia e liberdade provisória

Em setembro de 2017 sou pronunciado e recebo liberdade provisória. Até aquele momento, a perícia complementar ainda não estava disponível para a defesa.

24 de janeiro de 2018

Juntada da perícia complementar

O laudo da perícia complementar foi juntado ao processo apenas em janeiro de 2018. Foi só neste momento que soubemos da existência da toalha. Não pudemos analisar nenhum dos elementos encontrados por esta perícia nos recursos da pronúncia, muito menos na resposta à acusação.

Agosto de 2023

Juntada de imagens coloridas

Apenas em agosto de 2023, 7 anos após o falecimento de Priscylla e um dia antes da data inicial marcada para julgamento, a defesa recebeu imagens das perícias realizadas, coloridas e em melhor resolução, anexas ao processo que agora já era digital. Ainda assim, as imagens do exame tanatoscópico não foram encontradas ou não existiram. As fotografias foram solicitadas em diversos momentos desde 2016 e só foram disponibilizadas por força de um Habeas Corpus.

Provas Cruciais Descartadas

Durante a perícia inicial, itens importantes como o estojo e o próprio projétil que tirou a vida de Priscylla não foram recolhidos. Apenas três dias depois, uma perícia complementar coletou esses elementos, assim como uma toalha com sinais de sangue, que poderiam ter fornecido uma compreensão mais precisa da cena. Como uma perícia deixa de recolher o projétil de um caso assim? Minha esposa tinha dois ferimentos na cabeça: um de entrada e outro de saída. A perícia não deveria ter varrido o quintal até encontrá-lo? E como uma toalha, cheia de marcas que aparentavam ser pólvora, ensopada de sangue e com vários rasgos semelhantes a perfurações é deixada largada no local? A negligência desde o primeiro dia prejudicou toda a investigação.

Quando a perícia complementar aconteceu na tarde do dia 20/07/2016 eu já estava preso, já tinha sido "apresentado" para a imprensa como um assassino e a autoridade policial já tinha concluído que o tiro teria sido a distância - porque a perícia de local de crime e a tanatoscópica não tinham encontrado os sinais secundários do tiro como pólvora na pele e marcas de queimadura, que Priscylla tinha usado a mão para se defender - porque o exame residuográfico nela tinha dado positivo na mão esquerda - e que eu era o responsável por sua morte. Fui preso dia 19 e exibido como um monstro para a sociedade paraibana ao meio dia do dia 20. Àquela altura, a toalha ainda não havia sido recolhida e o projétil, aparentemente cheio de fiapos de tecido em sua extremidade, não havia sido encontrado, mas o personagem já estava montado e o caso encerrado.

Trecho do laudo de perícia complementar (1/3)

Trecho do laudo de perícia complementar (2/3)

Trecho do laudo de perícia complementar (3/3)

Toalha recolhida pela perícia complementar

Estojo recolhido pela perícia complementar

Projétil recolhido pela perícia complementar

Laudos Contraditórios

Os laudos periciais contradizem um ao outro em aspectos cruciais, como a descrição das lesões. Enquanto um laudo descreve as bordas da lesão de forma irregular, indicando tiro à curta distância, outro descreve a lesão de forma ovalar, sugerindo outra trajetória. Essas contradições não foram devidamente consideradas durante o julgamento.

Na ausência de imagens em boa qualidade das fotos do local do crime, essenciais para uma análise minuciosa, o Dr. Levi Inimá de Miranda — renomado perito em Medicina Legal, autor do livro "Balística Forense: do Criminalista ao Legista" e médico perito legista aposentado da Polícia Civil do Rio de Janeiro — foi forçado a trabalhar com dados incompletos. Diante das discrepâncias entre a descrição dos ferimentos nos laudos de local de crime e tanatoscópico, ele chegou a questionar o próprio sentido do disparo, sugerindo que poderia ter ocorrido da esquerda para a direita, em vez da direção sugerida pela perícia oficial. Essa contradição entre os laudos, somada à falta de acesso a imagens nítidas, dificultou significativamente o trabalho de análise independente e levanta dúvidas sobre a precisão da interpretação oficial dos fatos.

Dr. Levi elaborou uma laudo preliminar de mais de 100 páginas. Infelizmente ele pesou nos termos utilizados ao questionar o trabalho e a capacidade dos peritos oficiais e isso acabou trazendo uma antipatia maior dos agentes públicos ao analisar o seu trabalho e a qualquer tentativa de minha defesa, mas ainda assim sou grato por toda luz que ele me trouxe naquele momento.

Trechos dos laudo de local de crime e tanatoscópico

Trecho da primeira análise de Dr. Levi (1/3)

Trecho da primeira análise de Dr. Levi (2/3)

Trecho da primeira análise de Dr. Levi (3/3)

Imagem do ferimento descrito como de entrada

Exame de Resíduos de Pólvora Ignorado

Não foi realizado o exame de resíduos de pólvora em mim, algo que deveria ser padrão em casos como esse. Fui eu quem chamei o socorro. Eu estava presente quando a Polícia Militar chegou. Estava presente enquanto a polícia judiciária, representada por um delegado e uma equipe de peritos, fazia o seu trabalho. Por que não fui encaminhado dali para o IML? Se a perícia de local de crime já descartava o suicídio como descrito em seu laudo, por que não já saí dali preso e não passei pelo exame residuográfico? A ausência desse exame deixa em aberto uma questão crucial: quem realmente disparou a arma? A falta desse procedimento reforça a falha na investigação desde o início. Quando solicitei esse exame no momento da minha prisão, no dia seguinte, recebi a recusa do IPC em documento que está juntado ao processo.

Já o exame residuográfico realizado em Priscylla detectou a presença de resíduo de chumbo em sua mão esquerda, o que indicaria que ela própria disparou a arma. Essa conclusão é apoiada pelo próprio laudo do exame que afirma que a presença de chumbo na mão dela pode ser explicada por ela ter realizado o disparo. Porém, a investigação desconsiderou essa possibilidade e, sem qualquer embasamento técnico ou laudo complementar, concluiu que o resíduo de chumbo teria sido resultado de uma tentativa de defesa contra um agressor.

A interpretação dada pela autoridade policial não só contradiz o exame residuográfico, como também reforça uma teoria sem fundamento, desviando a investigação da única explicação possível para os eventos daquela noite: Priscylla tirou a própria vida. Ignorar o laudo técnico para sustentar uma hipótese de agressão é uma das graves falhas do processo que resultou na minha injusta condenação.

Para demonstrar a possibilidade ou não do que foi concluído pelo inquérito policial, minha defesa técnica solicitou que um ensaio científico fosse realizado pela equipe do Prof. Adenaule James Geber de Melo, Mestre em Ciência de Materiais com Aplicações Forenses pela Universidade Federal de Pernambuco. Este estudo pode ser baixado clicando aqui.

Trecho do laudo de perícia de local de crime

Trecho do laudo de exame residuográfico

Trecho do inquérito policial

Trecho de questão feita para perito

Trecho de resposta de perito

Trecho da conclusão de ensaio científico

Trecho da solicitação de residuograma em minhas mãos

Trecho da justificativa do IPC para não realização do residuograma

Infraestrutura Deficiente e Impacto na Qualidade da Perícia

Na época da investigação, o Instituto de Polícia Científica (IPC) de João Pessoa enfrentava uma situação alarmante de precariedade. Entre 2017 e 2018, foi amplamente divulgado que o IPC estava sucateado, com falta de reagentes, equipamentos, e até condições básicas de trabalho, o que comprometeu severamente a qualidade das perícias realizadas. O Ministério Público do Trabalho chegou a fechar temporariamente o IPC de João Pessoa após constatar essas condições críticas, incluindo problemas na estrutura física do prédio e na disponibilidade de materiais essenciais para análises forenses.

As condições precárias do IPC levantam dúvidas sérias sobre a precisão e confiabilidade das perícias conduzidas em meu caso. A falta de reagentes e equipamentos adequados comprometeu a capacidade de análise, e muitas das provas foram tratadas em um contexto de recursos insuficientes, o que pode ter afetado diretamente a qualidade dos laudos e a interpretação dos fatos. Essas condições foram amplamente denunciadas por peritos e órgãos oficiais, mas o impacto disso no meu caso foi completamente ignorado.

Fávio Fabres sobre exoneração (1/3)

Fávio Fabres sobre exoneração (2/3)

Fávio Fabres sobre exoneração (3/3)

Notícia na imprensa sobre interdição do IPC (1/3)

Notícia na imprensa sobre interdição do IPC (2/3)

Notícia na imprensa sobre interdição do IPC (3/3)

Ministério Público Acusou Dois Tiros

A denúncia tendenciosa do Ministério Público narra que houve dois disparos, o que foi decisivo para a condenação. A teoria dos dois tiros foi mantida, desde a denúncia proferia ainda em 8 de agosto 2016, menos de um mês após a morte de Priscylla, até o final do júri em 2023, mesmo sem evidências para sustentá-la, influenciando a opinião da imprensa, da sociedade paraibana, de familiares de Priscylla e, certamente, do júri. Como poderia ter sido suicídio com dois tiros? Quem acreditaria no que eu estava dizendo? Veja o tamanho do Estado, o peso de uma acusação dos órgãos oficiais contra um cidadão comum. Eu não tive chance alguma de defesa contra tamanha aberração. O que eu poderia ter feito? O que você faria em uma situação assim?

Imagino que o representante do Ministério Público tenha lido superficialmente o relatório da investigação e visto "dois ferimentos provocados por arma de fogo" e pronto. Se tivese continuado por mais algumas linhas, teria percebido que era um ferimento de entrada e outro de saída. Claro! Eu passei algum tempo acreditando que ao menos isso seria corrigido, sabe? Mas chegou o dia da primeira sessão da audiência de instrução e o magistrado leu a mesma denúncia para todos os presentes: imprensa, nossos familiares, nossos amigos, estudantes e curiosos. A audiência continuou em outra data e novamente foi lida a denúncia contando que eu, portando uma pistola carregada com 10 munições, sem motivo aparente, sem histórico algum de brigas ou agressões, no meio da madrugada de um domingo para segunda, agindo sob a vontade de matar, efetuei não um, mas dois tiros contra minha esposa. E ainda acertei um tiro, a distância, em um local escuro, que entrou pouco acima de uma orelha e saiu quase na mesma posição em relação à orelha oposta. Tudo isso sem que nenhum vizinho escutasse uma discussão ou um pedido de socorro, muito menos o tiro. Não precisava fazer sentido. Não precisava ser verdade. A denúncia foi essa, é a mesma desde então e foi por ela eu fui condenado. Esta denúncia completamente injusta e equivocada continua influenciando e sendo citada nas decisões dos tribunais superiores em minhas apelações.

Trecho da denúncia do Ministério Público (1/2)

Trecho da denúncia do Ministério Público (2/2)

Acesso Restrito e Tardio às Provas Cruciais

Desde 2016, desde a primeira oportunidade de manifestação no processo que tive, minha defesa solicitou acesso às imagens e documentos da perícia em mídia digital e em alta resolução, essenciais para compreender os detalhes da cena e preparar uma defesa adequada. No entanto, esse acesso foi negado por anos, mesmo com pedidos formais em várias ocasiões. O laudo complementar, aquele reealizado dois dias depois do falecimento de Priscylla, só foi juntado ao processo em 2018, quando a fase de instrução já havia terminado. Ele era essencial, porque antes dele não sabíamos da toalha e não sabíamos do estado do projétil. Ainda assim foi somente em 2023, a apenas um mês do julgamento, que o Tribunal de Justiça determinou a liberação das fotos em alta resolução, uma decisão que o Tribunal do Júri havia negado anteriormente, impedindo que tivéssemos um preparo completo e adequado. Antes de 2023 só tínhamos acesso às fotos impressas em papel, em baixíssima qualidade, já que o processo naquela épora era físico.

Entre as provas acessadas pela primeira vez em 2023, estavam as imagens da toalha encontrada na cena. Até então, não tínhamos qualquer informação visual ou técnica sobre como essa toalha estava, o que limitou severamente nossa capacidade de contestar as alegações da acusação. Para agravar a situação, descobrimos que algumas dessas imagens estavam disponíveis em perfis de redes sociais dos próprios peritos oficiais envolvidos no caso, enquanto nossa defesa era continuamente impedida de analisá-las. Essa restrição não só violou o direito à ampla defesa, mas também expôs um claro desequilíbrio de acesso à informação em um processo que resultou em uma condenação injusta.

Após o falecimento do Dr. Levi, o Dr. Antonio Nunes - perito médico legista da Polícia Civil do Piauí e Perito-Geral do Departamento de Polícia Científica do Estado do Piauí - passou a atuar como assistente técnico da defesa. Com as imagens finalmente disponíveis, Dr. Antonio pôde identificar detalhes cruciais que haviam permanecido ocultos da defesa por anos: os rasgos e marcas de pólvora na toalha, resquícios de tecido no projétil e no ferimento de entrada, e o formato das gotículas de sangue na parede, indicativas de alta velocidade, compatíveis com um disparo a curta distância.

Ainda assim, a defesa não teve acesso às imagens do exame tanatoscópico, o que levanta questões sobre a precariedade do IPC de João Pessoa na época. Será que a falta de estrutura impediu o registro adequado dessas evidências? Apesar das limitações, com o material que teve em mãos, Dr. Antonio pôde concluir que as evidências eram compatíveis com um tiro encostado, onde a toalha foi utilizada como um abafador de ruído. Segundo ele, os efeitos secundários do tiro foram mascarados pela toalha, que serviu como anteparo, evitando a formação de queimaduras de pólvora e outros efeitos secundários no corpo de Priscylla.

Dr. Antonio também observou que o ferimento de entrada apresentava um padrão estrelado, com bordas irregulares, típico do retorno de gases no caso de um tiro encostado. Esse detalhe reforça que o disparo ocorreu em contato direto. Além disso, a toalha abafou o som do tiro, o que explica por que os vizinhos não foram despertados e por que, ao acordar, pensei que o barulho tivesse sido causado pela queda de uma telha.

Instagram de perito oficial (1/2)

Instagram de perito oficial (2/2)

Fotografia ampliada da toalha

Fotografia da toalha acondicionada em embalagem

Fotografia do projétil acondicionado em embalagem

Fotografia dos respingos de sangue no muro

Trecho do depoimento de um vizinho

Exemplo das fotografias que tivemos acesso

Trecho de juntada em 2018

Desconsideração de Fatores Pessoais e Psicológicos

Priscylla e eu compartilhávamos uma vida repleta de cumplicidade e carinho. Desde pequenos gestos, como bilhetinhos carinhosos, até aventuras em viagens e momentos no clube de tiro, sempre estivemos lado a lado, enfrentando desafios e celebrando conquistas. Tivemos inúmeros momentos juntos, nos divertindo, apoiando um ao outro em tudo o que fazíamos. Ainda assim, esses momentos não foram considerados relevantes para o caso, ignorando totalmente o vínculo que tínhamos e a harmonia em nosso relacionamento.

Pris era uma pessoa muito organizada financeiramente. Porém, descobri, tarde demais, que ela estava afundando em dívidas em uma empresa que mantinha em seu nome para ajudar o pai. Esse peso emocional e financeiro, junto com a pressão familiar e questões de saúde que ela enfrentava, não foram investigados nem analisados como possíveis fatores que poderiam ter contribuído para os eventos daquela noite. Esses problemas pessoais e psicológicos foram completamente ignorados, mesmo tendo potencial para mudar a compreensão dos fatos.

Quando fui preso, entreguei meu celular desbloqueado, incluindo nosso histórico de mensagens de carinho no WhatsApp, que mostravam o amor e a parceria entre nós. Contudo, essas mensagens nunca foram incluídas no processo, certamente porque não contribuiriam para o personagem monstruoso que a acusação havia construído. Infelizmente, passei mais de um ano preso sem acesso ao meu número ou ao meu celular, e após minha soltura, não recuperei esses dispositivos nem os cartões SD com nossas fotos e memórias de uma vida juntos, inclusive as fotos do nosso casamento.

A narrativa apresentada pela acusação ignorou completamente a realidade de nosso relacionamento. As provas de que éramos um casal amoroso e cúmplice em tudo não foram sequer levadas em consideração. Ao deixar de investigar essas questões pessoais e ignorar as evidências de nossa relação harmoniosa, o processo nos desumanizou e ignorou completamente as pressões e dilemas que ela enfrentava. Perdemos não apenas o contexto, mas também a verdade sobre quem éramos e sobre o que realmente aconteceu naquela noite. Repito mais uma vez: Priscylla era uma mulher forte, muito inteligente e dona de si. Independente, ela tinha carro próprio, profissão, emprego e renda. Ela não seria vítima tal qual pintada neste processo. Ela jamais teria ido para os fundos de nossa casa fugindo de um agressor. Priscylla não teria vivido um relacionamento tóxico por 16 anos sem que ninguém soubesse disso, sem que não houvesse um depoimento neste sentido.

Twitter de Priscylla (1/8)

Twitter de Priscylla (2/8)

Twitter de Priscylla (3/8)

Twitter de Priscylla (4/8)

Twitter de Priscylla (5/8)

Twitter de Priscylla (6/8)

Twitter de Priscylla (7/8)

Twitter de Priscylla (8/8)

Meu Facebook (1/3)

Meu Facebook (2/3)

Meu Facebook (3/3)

Cartão de Priscylla

Último Aniversário

Planilha de Despesas

Exemplo de dívida fiscal

Aluguel atrasado

Clube de tiro (1/3)

Clube de tiro (2/3)

Clube de tiro (3/3)

Ações sociais da associação (1/4)

Ações sociais da associação (2/4)

Ações sociais da associação (3/4)

Ações sociais da associação (4/4)

Viagens (1/2)

Viagens (2/2)

Homenagem da Fiel João Pessoa

Priscylla

Nossa última conversa, conversa daquelas de parar e sentar para tratar de algo, foi no sábado, dia 16, pouco antes do almoço. Eu estive ausente a semana inteira, porque na segunda precisei ir ao Rio de Janeiro em uma viagem que aguardava apenas o encerramento do semestre de aulas. Voltei na madrugada da sexta, dia 15. Sentamos em nossa cama. Ela queria conversar e primeiro disse que era sobre o trabalho. Pris relatou que não estava bem, que não queria voltar na segunda-feira, disse que queria ficar em casa, que queria ficar como ficou no final de 2015 e começo de 2016, antes de aceitar o emprego novo. Ela estava com saudade da gente, pensei. Eu também estava. Aquele primeiro semestre de 2016 tinha sido duro para nós dois. Ela estava indo ao trabalho às 7h, às vezes antes. Muitas vezes eu só deitava para dormir às 2 ou 3 da manhã. Acordava às 9h para minha primeira reunião do dia no trabalho remoto. No fim do dia eu saía para ir dar aula às 18h e voltava depois das 22h. Ela chegava pouco depois das 19h e quase sempre já estava dormindo quando eu chegava em casa vindo da Universidade. Tentando não acordá-la, eu emendava novamente pela madrugada. Os fins de semana passavam voando e em muitos eu precisava trabalhar como se fosse um dia qualquer. Era um sacrifício consciente, eu achava. Acreditava que acabaria logo. Eu tinha planos de deixar a Universidade no ano seguinte. Não fazia sentido ela dizer que não queria ir ao trabalho, sabe? Ela estava sendo reconhecida constantemente por seus superiores. Em muitos outros momentos naqueles meses eu a vi animada, empolgada. Eu argumentei sobre isso com ela. Não deveria! O ponto não era esse, a dor não era essa. Eu precisava ter ouvido mais, muito mais.

Ela continou e disse que queria engravidar, que naquele rítmo não seria possível. Eu disse que ela precisava voltar ao médico, que precisava continuar o tratamento da endometriose. Ela sempre postergava a ida ao médico, porque achava que o seu peso seria questionado e isso era algo realmente dolorido para ela. Foi o que a afastou da área de Nutrição. Perguntei se ela não achava melhor aproveitar o plano de saúde que a empresa oferecia ficando por lá ao menos pelos 6 meses seguintes. Ela calou e não disse mais nada. Novamente eu argumentei quando deveria ter apenas ouvido a dor da pessoa mais importante da minha vida, da minha metade, da minha companheira.

Hoje eu sei que aquela conversa era o grito dela pedindo ajuda. Algo a estava consumindo e eu não fui capaz de fechar a boca, ouvir, sentir e ser o ombro que ela precisava. Eu achava que tinha a resposta para tudo e que nenhum problema era grande o suficiente. Eu não poderia estar mais errado! Não sei exatamente qual foi a gota d'água que transbordou o copo dela naquela madrugada, ali sozinha no silêncio de nossa casa. Será que eram os problemas financeiros da empresa? Ela normalmente almoçava na casa dos pais durante a semana, já que moravam próximos ao escritório onde Pris trabalhava e nossa casa era bem distante. Era disso que ela queria fugir? Eu não soube escutar e agora jamais saberei a resposta.

Naquele domingo, acordei às 05:00 para experimentar uma bicicleta que havia chegado no dia anterior. Voltei para casa às 06:00 com frutas para nosso café da manhã e Pris já está acordada. Tínhamos uma reunião importante na associação que estava retornado às atividades depois de um hiato de mais de 1 ano. Pris decide não ir para concluir a faxina que havíamos iniciado no dia anterior, uma faxina grande que não fazíamos há meses por conta do semestre agitado, e eu vou sozinho.

Saio de casa reunião ao meio dia e retorno para casa às 19:00. Pris ainda está concluindo a faxina. Diz que falta apenas posicionar umas cadeiras na sala e passar um pano na cozinha. Eu deito e pego no sono. Acordo com ela me chamando para jantar. Pergunto se ela não vai comer e ela diz que almoçou tarde e está sem fome. Janto vendo TV. Levo o prato para lavar na cozinha e ela está lá. Ela pega o prato e diz que resolve, me dá um abraço e diz que me ama. Volto para o quarto, vejo TV e caio no sono novamente. Acordo com um barulho alto e penso ter passado pouco tempo desde que adormeci, mas não, já eram quase 4h da manhã do dia 18. Eu perdi minha esposa. Eu tentei salvá-la, liguei para todos os serviços de emergência, chamei vizinhos, tentamos locomovê-la até um carro, fiz massagem cardíaca até o primeiro policial chegar. Não tinha mais o que ser feito. Ela tinha partido e aquela madrugada nunca mais acabará.

Eu não tinha motivo algum. Ela era minha razão, minha companheira em tudo, em absolutamente tudo.

Por fim, deixo uma gravação que ela me enviou na sexta-feira, enquanto voltava do trabalho para casa, como se já estivesse planejando uma despedida. Por sorte eu enviei a gravação para o meu e-mail no dia do sepultamento dela, poucas horas antes de ser preso. Este é o único registro de voz que tenho da minha esposa, o único que não me arrancaram.

O Impacto dos Erros na Minha Condenação

Os erros cometidos pelo Estado durante a investigação e o julgamento moldaram o resultado injusto deste processo. As falhas na coleta de provas, os laudos contraditórios, a falta de exames essenciais e a manutenção de teorias sem evidências concretas resultaram na condenação de um inocente. Quem poderia mensurar o tamanho do estrago causado pelos entes públicos durante este processo? Se você, leitor, procurar agora meu nome completo no Google verá que eu não tinha a menor possibilidade de ser inocentado por um corpo de jurados leigos e influenciados pela mídia. Eu preciso de ajuda!